6.2.11

Sem Santuário para o Cisne

Minor spoiler alert: Talvez você queira assistir a Santuário e Cisne Negro antes de ler e comentar esse post. You have been warned.
Disclaimer: Glauco Paiva é mergulhador recreativo, não técnico. Isto posto, já está na água há bons 16 anos.
Há mais ou menos três anos, quando fiz meu curso de resgate em mergulho, a primeira coisa que ouvi foi: “por mais que você queira ajudar alguém, a sua própria segurança vem em primeiro lugar. Reconheça seus limites e não se torne mais uma vítima”. A segunda foi: “aprenda a lidar com situações de estresse embaixo d’água, e não permita que evoluam para o pânico. O pânico vai sobrepujar sua técnica e treinamento, e aí sim você estará em real perigo.”
Na época eu estava mergulhando com muito mais freqüência do que faço hoje, e meu então instrutor, um sujeito que entende muito sobre o assunto, tentou me cooptar para o mergulho em caverna. Seria, naturalmente, o próximo passo na minha evolução subaquática. Eu quase fui, mas o medo falou mais alto. Entrar em cavernas alagadas é o que há de mais técnico e radical na prática do mergulho. A coisa toda me atrai e muito, mas... não sei. Ainda não é pra mim.
...Santuário é um filme em que a vaca começa a ir para o brejo sem rebreather quando e porque um mergulhador altamente experiente foge do que havia planejado para a descida. Pela Ordem: nós, seres humanos, somos mesmo teimosos em desenvolver e utilizar tecnologias que nos permitam respirar sob a água, voar, essas coisas. Papai do Céu não nos fez para isso e, portanto, é preciso muito cuidado e respeito ao imponderável quando estamos nesses ambientes inóspitos. Minha sábia bisavó dizia que o mar só afoga quem sabe nadar. Faz sentido: boa parte dos imprevistos em mergulho acontece quando abusamos da autoconfiança e tentamos ir além do que deveríamos. A mesma linha de raciocínio se aplica a outros esportes radicais – eu nunca ouvi falar de um alpinista iniciante morrendo no Everest.
De volta ao filme: as atuações são lineares e estereotipadas. Sem surpresas. Mas a obra vale pelos seus reais protagonistas: a caverna e o rio. Esses sim estão ali com firmeza de propósito e cumprem seu papel com maestria. E se engana quem pensa que esse papel é causar baixas no elenco medíocre dirigido por James Cameron até afundá-lo numa alegoria geológica de Titanic. Não – A função dessas forças milenares na tela é simplesmente estar ali, bem como na vida real, com todo seu misterioso encanto. Um convite ao arrebatamento, mas também ao perigo. Entre na água com respeito. Confira seu velame reserva antes de saltar do avião. Olhe bem as cordas e o mosquetão antes do rapel. Ou sofra as conseqüências, porque a natureza não vai parar no sinal vermelho nem respeitar a preferencial de quem sobe. Aliás, quando a gravidade entra no jogo, pode estar certo de que quem desce leva vantagem... No mais, fica desde já a recomendação para que ao menos os amigos mergulhadores ajudem a engordar um pouco mais a conta bancária do Sr. Avatar. Vocês vão curtir.
E completando o fim de semana cinematográfico, fui ver a sempre ótima Natalie Portman em Cisne Negro. Merece o Oscar por sua entrega Grotowiskiana a uma personagem que passa a maior parte do tempo sendo tudo menos isso. A beleza desse paradoxo torna sua atuação imperdível. Mas o filme como um todo... Preciso dizer:
SPOILER ALERT
...Depois de assistir ao trailer, esperava ver um encontro entre Lago dos Cisnes e Rocky Balboa. Acabou que vi o Clube da Luta com sapatilhas de ponta kafkianas. Tanto melhor. Mas, ainda assim, previsível.