1.8.04

O Palco, sem a Platéia

Qualquer ator que entre no Palco e veja apenas um Palco está errado. Estive essa semana na Casa das Artes de Laranjeiras, renovando minha matrícula para mais um semestre de aprendizado dramático. Com a escola vazia, fiz questão de visitar o espaço Yan Michalski, onde recentemente estive em cartaz com Sonho de uma Noite de Verão, de Shakespeare. Cenário desmontado, refletores ausentes e cadeiras vazias, vi-me a repetir um exercício que fiz antes da estréia e depois do último espetáculo. Vaguei pelo espaço com as mãos abertas, num quase carinho em chão e paredes, como que esperando que madeira e concreto frios me dissessem algo. Há poucos dias, havia ainda uma floresta naquela sala. Ela respirava, viva, em juta, folhas secas e flores de plástico, sob os focos verdes. Privada dos adereços, a sala me trouxe ecos das apresentações: as reminiscências da Platéia, os espectros de atores e atrizes em movimento frenético e paradoxalmente silencioso na coxia, a excitação explícita de quem estava em cena. O Palco, que parecia dormir, aqueceu-me o espírito com vibrações ressonantes do que foi, e profecias desencontradas do porvir. Ao longe ouvia mantras fonoaudiológicos. Na sala de cima, os estudantes de um curso de férias faziam uma aula de voz. Talvez tenham sido eles os responsáveis pela impressão de audio tribal que experimentei, lembrando-me das aulas de improvisação que tive naquele mesmo espaço, ao longo do último ano. Um Palco, por certo, nunca é só um Palco. Ele aquece e vibra, mesmo em estado latente. Quem tiver olhos, veja. Quem tiver ouvidos, ouça.

Nenhum comentário: